sábado, 27 de junho de 2009

Os Bons Investimentos Públicos e Suas Consequências

Na imprensa, sempre que se fala de investimentos em obras públicas, geralmente só são discutidos todos aqueles que vão ser realizados no futuro. Seria muito interessante analisar os que foram executados no passado e observar os verdadeiros resultados, tendo em conta o seu custo-benefício. A introdução do comboio na Ponte 25 de Abril e o Metro do Porto foram, sem dúvida, dois dos melhores projectos de mobilidade que foram levados a efeito nos últimos anos, em Portugal. Estes dois exemplos demonstram que as populações aderem ao transporte público, sempre que estes correspondem aos seus interesses.

O tráfego rodoviário, na Ponte 25 de Abril, praticamente estagnou, nos últimos cinco anos. Os valores médios anuais, considerando a soma dos dois sentidos, foram os seguintes: 155 mil veículos no ano de 2004, 156 mil em 2005, 155 mil em 2006, 155 mil em 2007 e por fim 153 mil em 2008.

Ao contrário, o tráfego ferroviário na mesma ponte quase duplicou. Em 1999, entrou em funcionamento o comboio na Ponte 25 de Abril que permitiu criar uma nova ligação ferroviária entre as duas margens do rio Tejo, efectuando, actualmente, a conexão desde Setúbal (margem Sul da região de Lisboa) até Areeiro (margem Norte), tendo o tráfego quase duplicado de 11,6 milhões de passageiros, no ano 2000, para 21,4 milhões em 2006 (mais 84,4%). Significa isto que, se não existisse esta nova ligação, o congestionamento rodoviário, na Ponte 25 de Abril, teria sido bem pior. Este é um exemplo de como o investimento no transporte publico melhorou a situação.

Convém recordar que, quando foi inaugurada a nova Ponte Vasco da Gama, passado um ano, o tráfego na Ponte 25 de Abril teve um aumento apreciável. Ou seja, a nova travessia rodoviária não melhorou o congestionamento na antiga ponte.

Na região do Porto, antes do Metro existir, cerca de 61% das pessoas circulavam de automóvel, 30% de autocarro e 9 % de comboio. A cidade tem graves problemas de mobilidade e, com o funcionamento da nova rede do Metro, certamente se verificará uma alteração substancial no valor das percentagens referidas.

Quando estiver terminada a 1ª fase do Metro, são esperados 82,5 milhões de passageiros, cerca de 226 mil por dia. O número de clientes subiu de 9,8 milhões em 2004 para 38,6 milhões em 2006 (mais 293,8%), tendo uma média de 180 mil clientes em cada dia útil.

Tendo em conta o número de passageiros esperados diariamente, bem como a poupança nos respectivos tempos de viagem, fácil será concluir sobre o enorme impacte na qualidade de vida dos seus cidadãos e economia da Grande Área Metropolitana do Porto, que se tornará mais competitiva e atraente, a médio e longo prazo, permitindo que outras actividades económicas se realizem de forma mais eficaz e rentável.


VANTAGENS DO TRANSPORTE PÚBLICO


A cidade americana de Houston é uma referência, como um exemplo a não seguir, por ter graves problemas de mobilidade, e está a pagar muito caro por ter baseado a sua circulação apenas no automóvel.

Para se ter uma ideia da gravidade da situação, a União Internacional de Transporte Público (UITP) dá como exemplo a comparação entre as cidades de Singapura e Houston, que possuem aproximadamente a mesma população e rendimento per capita. Por ano, Singapura gasta menos 10 mil milhões de dólares para transportar os seus habitantes que a cidade de Houston, o que representa cerca de menos de 3000 dólares por habitante.

Esta diferença, em parte, também se explica devido à diferença da densidade populacional mas, mais importante, deve-se ao facto de que em Singapura 52,75% dos seus habitantes utilizam o transporte público, enquanto que, em Houston, 95,5 %, utilizam o veículo privado.

Na Europa, o transporte público consome quatro vezes menos energia que o transporte individual e, no Japão, esse valor é 10 vezes inferior. Por outro lado, segundo estudos realizados pela APTA (American Public Transport Association) o transporte público cria duas a três vezes mais postos de trabalho que o privado e é muito mais eficaz porque uma linha de Metro ou comboio suburbano pode transportar mais de 50 mil passageiros / hora.

No ano de 2006, foi divulgado um relatório do Eurostat sobre o número de automóveis, por habitante, na União Europeia (UE). Ficou a saber-se que, entre 1990 e 2004, houve um aumento de 38 por cento no número de automóveis no conjunto dos 25 países, atingindo a proporção de um carro para cada duas pessoas. Quanto a Portugal, as tabelas mostram que, em 1990, existiam 258 carros por cada mil habitantes e, passados 14 anos, esse número era de 572. Na UE, Portugal está agora na 3ª posição, tendo à sua frente a Itália e o Luxemburgo. Se considerarmos os países que faziam parte da UE desde 1990, Portugal teve o maior crescimento no número de viaturas pois o aumento foi de 135%.

Além deste forte aumento, serão investidos, nos próximos anos, mais de 15 mil milhões de Euros nas SCUTS, o que representa um enorme esforço financeiro. O modo rodoviário foi, sem dúvida, a grande aposta dos sucessivos Governos nos últimos vinte anos. Por outro lado, verificou-se que, nas mais importantes cidades do nosso País, a maioria dos cidadãos se desloca em viatura particular, sendo Lisboa um dos casos mais graves porque, em média, cada automóvel transporta só 1,2 passageiros.

Nas famílias portuguesas, os gastos em combustíveis atingem entre 76 a 125 Euros por mês, ou seja, entre 916 a 1500 Euros, por ano, o que representa uma percentagem importante do orçamento familiar, tendo em conta o rendimento médio.

Concluiu-se que, num país como o nosso, com poucos recursos económicos, dirigiu-se o maior esforço para o modo de transporte mais caro, mais poluente e que maior número de mortes, feridos e prejuízos provoca na sociedade.

Rui Rodrigues

rrodrigues.5@netcabo.pt

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domingo, 21 de junho de 2009

Mudança da Bitola Espanhola na Rede Ferroviária Isola-nos

O Ministério de Fomento de Espanha decidiu efectuar um estudo que deverá estar concluído até ao final do ano e que tem por objectivo a mudança da bitola (distância entre carris) de toda a rede ferroviária de Espanha nos próximos anos. Esta alteração deverá representar investimentos de cinco mil milhões de Euros. Além das novas vias em bitola europeia que estão em construção, todas as linhas convencionais antigas passarão a ser em bitola 'standard'. As vias já electrificadas, de três mil volts e corrente contínua, terão a mesma corrente e tensão eléctrica da rede francesa (25 mil volts e em corrente alterna).

As vantagens de toda esta operação é enorme, porque vai permitir o livre trânsito de comboios de todo o território espanhol, portos e plataformas logísticas para a União Europeia (UE).

As alterações em Espanha vão ter grande impacto em Portugal e, se nada for feito, em termos ferroviários, o nosso País passará a ser uma ilha, pois já nem a Espanha terá vias de bitola ibérica.

O nosso País necessita urgentemente de possuir uma rede que permita a circulação de todos os comboios de bitola europeia para resolver o grave problema da interoperabilidade, que é a capacidade de conectar os sistemas ferroviários dos diferentes países (bitola, sinalização, electrificação, etc...), o que provocará um aumento do mercado e uma forte redução nos custos de exploração, de 30 a 40 %, e nos custos dos respectivos equipamentos. Com um sistema único de gestão, os comboios podiam circular livremente pela UE, mas, por estas condições não existirem, a velocidade média é de apenas 18 Km/h.

A opção por soluções 'standard' e compatíveis com as das restantes redes da UE irá permitir adquirir material circulante a preços que, em muitos casos, podem atingir valores 50% mais baixos. Portugal terá grandes desvantagens se continuar dependente de soluções específicas.


COMBOIOS DE DUPLO EIXO COM "INTERCAMBIADOR" NÃO SERVEM


Existem comboios de duplo-eixo que podem circular sobre as duas bitolas e, para que tal seja possível, impõe-se a instalação de um "intercambiador" que consiste numa instalação onde se realiza a mudança da distância entre rodas. A escolha de comboios de duplo-eixo não irá resolver o grave problema de interoperabilidade que a actual rede ferroviária portuguesa apresenta e, mais importante, não é solução viável para o transporte de mercadorias. Com efeito, na futura rede espanhola, a esmagadora maioria dos comboios será exclusivamente de bitola 'standard' e, só em casos pontuais, a Espanha irá utilizar comboios de duplo eixo. Se Portugal optar por este tipo de comboios ficaria inacessível para a maioria da futura rede espanhola e da europeia, porque nenhuma empresa iria adquirir, de propósito, este material circulante para transportar passageiros de e para o nosso País. A França, Alemanha ou Itália não utilizam estes comboios, pela simples razão de que não têm o grave problema da diferença de bitola.

A Espanha, ao mudar em definitivo a sua rede, terá, obviamente, de abandonar o fabrico dos comboios de duplo-eixo. As mudanças no país vizinho, relativamente à sua rede ferroviária, deveriam levar os responsáveis portugueses a uma profunda reflexão sobre qual a prioridade dos investimentos a realizar nos próximos anos.

O Governo está a cometer um grave erro estratégico ao continuar a insistir na ligação dos portos nacionais, em bitola ibérica, quando a Espanha vai mudar toda a sua rede para bitola europeia.

Rui Rodrigues

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